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Caminhos da Negritude na Poesia Moçambicana Simone Caputo Gomes (Universidade de S. Paulo – USP; Profa. Doutora de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa) “Não será uma reivindicação de valores? A negritude não será uma revisão dos conceitos do Belo, a reabilitação de parâmetros culturais e cultuais, a crítica a tabus de rejeição, uma legítima defesa contra os padrões reacionários da superioridade pela tonalidade da pele, textura do cabelo, forma do nariz, lábios finos ou espessos? (...) Uma teoria da negritude através da literatura ou das artes plásticas, afinal, ofende a quem?” José Craveirinha (1985) Vários pesquisadores encaram a Negritude e as polêmicas geradas em torno dela como uma espécie de período preparatório para a formação das literaturas nacionais africanas.1 Apoiada em várias leituras que aprofundam o tema, procurarei demonstrar as relações entre as propostas da Negritude (tomada em seu sentido lato, como evolução da consciência negra, e também em sentido estrito) e a poesia moçambicana nos anos 50 a 70 do século XX. Fernando J. B. Martinho propõe que, nos anos quarenta e cinqüenta do século XX, ao partir para a descoberta de si próprios, os poetas da África de língua portuguesa vão lançar mão de vários “paradigmas” para melhor definirem a sua identidade, dos quais destacamos: Zumbi (líder da República dos Palmares, no Brasil), Toussaint Louverture (precursor da independência do Haiti), Langston Hughes e Guillén, citados por Viriato da Cruz no poema “Mamã negra”; Ngola Kiluanji e a Rainha Ginga (heróis de resistência ao colonialismo), citados em “Ao içar da bandeira”, de Agostinho Neto); anônimos depositários da cultura tradicional (como o desconhecido irmão maconde do poema “Se me quiseres conhecer”, de Noémia de Sousa), as vítimas da violência racista (Willie McGee, citado por Francisco José Tenreiro no poema “Coração em África”), escritores, músicos, boxeurs, atletas da diáspora americana, em suma, figuras que representavam o orgulho negro de todo o mundo (MARTINHO, 1985, p. 523). Nesse período de afirmação, que precede a luta de libertação nacional, o intelectual africano era guiado por uma postura de adesão à condição do homem negro e seu mundo mental tinha por base os traços comuns das culturas africanas. Essa postura fraterna antecedeu a viragem decisiva para o aprofundamento na cultura nacional e a eclosão da luta armada. Segundo Fanon, no período de afirmação “os homens de cultura africana [falavam] mais de cultura africana do que de cultura nacional” (FANON, 1961, p. 209) e a literatura se propunha como “literatura de negros” ou do “mundo negro” (Ibidem, 207). Os autores do Renascimento Negro, da Harlem Renaissance representaram um estímulo para o indigenismo haitiano, para os estudantes antilhanos reunidos em torno da revista Légitime Défense e para os poetas que iriam expressar o projeto da négritude. Os ecos de Langston Hughes, Countee Cullen e Richard Wright (romancista) também iriam chegar aos poetas da África de língua portuguesa. Acompanhemos o trajeto teórico e histórico da “questão negra” traçado por Souza e Silva (p. 43), para depois situá-la em Moçambique. Seguindo-se à proposta da “personalidade africana” (african personality, 1893) por Blyden (descendente de escravos oriundos do Togo) em congresso de Freetown, em 1900, H. Sylvester Williams, advogado de Trinidad, organizou a primeira conferência pan-africana, a fim de suscitar um movimento de solidariedade a favor dos negros colonizados. Participante do evento, um homem que há mais de meio século militava pelo pan-africanismo, o Dr. W. E. Burghardt Du Bois, negro americano, declarava: "Naturalmente, a África é a minha pátria." Em 1897, no decorrer do Congresso de Londres, Du Bois já afirmava: "Se o Negro devesse um dia desempenhar um lugar na história do mundo, seria graças a um movimento pan-negro." Por sua vez, Marcus Garvey, jamaicano truculento que considerava a pele do mestiço Du Bois demasiado pálida para um negro, no quadro da Associação Universal para a Promoção dos Negros lançou a palavra de ordem de "regresso à África". Garvey devotou-se febrilmente à criação de organismos que concretizassem a idéia à qual se dedicara profundamente: um império racial africano, de que se proclamava presidente provisório, um Parlamento Negro, uma Liga Marítima da Estrela Negra. E imaginou um Paraíso em que os anjos eram negros e os demônios, brancos. Não hesitou em colaborar com os racistas do Ku Klux Klan, que como ele, mas por razões inversas, preconizavam que os Negros americanos fossem mandados para a África. A vida tempestuosa de Garvey foi marcada pela prisão e acabou obscuramente em Londres, em 1900. O Manifesto do Movimento do Niágara, em 1905, proclamou a "igualdade absoluta entre todos os cidadãos brancos e negros", sintetizando as preocupações de Du Bois e de seu grupo. Aquele, que fundara, por seu lado, a Associação Nacional para a Promoção das Gentes de Cor (base do "Black Renaissance"), tornava-se a viga mestra dos congressos pan-africanos que se realizaram sucessivamente em Paris em 1919, em Londres e Bruxelas em 1921, em Londres Lisboa em 1923 (em Portugal, desde 1912, fundara-se a "Junta de Defesa dos Direitos de África”), em Nova Iorque, em 1927. De início, marcadamente racial, a idéia pan-negrista tornava-se uma reivindicação política. Isso se confirmou, sobretudo, depois da segunda guerra mundial, no Congresso Pan-Africano de Manchester, presidido por Du Bois, em que era nítida ainda a predominância dos anglófonos. Pela primeira vez, porém, contrabalançava os próprios Africanos a influência dos Negros americanos. Os temas anti-imperialismo e anticolonialismo eram discutidos e, pela primeira vez, explicitamente reivindicada a independência nacional, tudo isto no quadro de uma opção socialista ou socialista-marxista. W.E.B. Du Bois (nascido em 1863 e considerado o pai do pan-africanismo contemporâneo), doutor em Filosofia e historiador cujos trabalhos revelaram aos companheiros negros um passado africano do qual se deviam orgulhar, destacou-se como voz de protesto contra a política imperialista na África, em favor das independências, e exerceu influência considerável sobre personalidades como Asikiwe Nandi, futuro presidente da Nigéria, Kwame N‘ Krumah, primeiro presidente da República de Gana (para quem o pan-africanismo foi uma das idéias-força) e Jomo Kenyatta, primeiro presidente da República do Quênia. Du Bois exerceu também profunda ascendência sobre escritores negros americanos. Seu livro Almas Negras (1903) tornou-se modelo para os intelectuais do movimento do Renascimento Negro (entre 1920 e 1940). Reagindo contra os estereótipos e preconceitos que circulavam a respeito do negro, o movimento glorificava a sua cor. Defendia a origem africana, o direito ao emprego, ao amor, à igualdade, ao respeito e propugnava ainda pela assunção da cultura. Esse programa foi revelado na revista The Nation, de 23 de junho de 1926, sendo considerado a declaração de independência do artista negro: Nós, criadores da nova geração negra, queremos exprimir nossa personalidade sem vergonha nem medo. Se isso agrada aos brancos, ficamos felizes. Se não, pouco importa. Sabemos que somos bonitos. E feios também. O tantã chora, o tantã ri. Se isso agrada à gente de cor, ficamos muito felizes. Se não, tanto faz. É para o amanhã que construímos nossos sólidos templos, pois sabemos edificá-los, e estamos erguidos no topo da montanha, livres dentro de nós. O humanista Jean Price-Mars, haitiano, notabilizou-se à época como o Pai do pan-africanismo cultural. Diplomata, historiador, sociólogo e doutor em medicina, inimigo ferrenho da assimilação e defensor das contribuições das culturas negras para a civilização mundial, foi um dos grandes inspiradores de Léopold Sedar Senghor. Na literatura, o romance Batouala (1921), do martiniquenho René Maran, propunha-se como um libelo contra a colonização francesa na África. Nos Estados Unidos, a música negra - o jazz, os blues e spirituals - e a produção dos escritores negros chamavam a atenção geral para a cultura e a causa que defendiam. Langston Hughes (nascido em 1902, de pai branco e mãe negra), representante do Harlem Renaissance e amigo pessoal de Léon Damas e de Senghor, foi um dos mais expressivos poetas negro-americanos e transportou para a poesia os ritmos e a cadência da música de seu povo, notadamente o blues. "O Negro Fala Sobre Rios" (The Negro Speaks of Rivers) é provavelmente o seu poema mais famoso. Nesse texto, considera a história das comunidades negras desde o Oriente bíblico e a África até a diáspora na América. Afirmando “Eu também sou América”, Hughes assume-se como filho da África: “Todos os tantãs do mato batem no meu sangue. Todas as luas selvagens e ferventes do mato brilham na minha alma”. Outros passos importantes para o que se chamaria mais tarde o movimento da Negritude foram a revista Légitime Défensee e La Revue du Monde Noir (“Revista do mundo negro”, 1931-32, seis números), que antecederam o jornal L'Etudiant Noir. Na ótica de Pires Laranjeira, aquelas revistas não chegariam, contudo, a “pautar-se por princípios éticos, estéticos e ideológicos que possam ser considerados de negritude” (2000, p. VII), se bem que já abordassem problemas culturais dos povos negros. Em 1935 (segundo Pires Laranjeira e não 1934, como habitualmente se demarca), o grupo integrado por Aimé Césaire, Léon Damas, Senghor, Ousmane Socé, Birago Diop, Leonard Sainville e Aristide Maugé fundava o jornal L'Edudient Noir, órgão da Associação dos Estudantes Martinicanos na França que se dedicava a temas e problemas dos estudantes negros francófonos. O periódico (1935-1940) era definido como um jornal corporativo e de combate, tendo por objetivo o fim da tribalização, do sistema de clãs em vigor no Quartier Latin. Martinicanos, guadalupeanos, guianenses, africanos, malgaches constituiriam, assim, “um único e mesmo estudante negro" (Apud MOURA, 1983, 45). Senghor, analisando o conteúdo do jornal, apontava que várias tendências ali se expressavam: "Césaire conduzia a luta, antes de tudo contra a assimilação dos antilhanos. De minha parte eu visava, sobretudo, analisar e exaltar os valores tradicionais da África Negra" (ibidem, 46). A Négritude propriamente dita nasceu, portanto, de um protesto intelectual de negros de formação cultural européia que tomavam consciência da diferença e da inferiorização que os europeus impunham aos descendentes da África. Foi Aimé Césaire que, no seu Cahier d'un retour au pays natal, em 1939, empregou o termo “negritude” pela primeira vez e assim a definia: "la conscience d'être noir, simple reconnaissance d'un fait qui implique acceptation, prise en charge de son destin de noir, de son histoire, de sa culture; elle est affirmation d'une indentité, d'une solidarité, d'une fidélité à un ensemble de valeurs noirs". Em torno do movimento, colocado em destaque a partir da década de 30, girarão debates desde a expressão artística até a necessidade de aniquilação do sistema colonial: “O tom exaltado que as discussões sobre a Negritude atinge é produto da indissolubilidade dos aspectos políticos, culturais e ideológicos de que ela é fato e factor _ para empregar a terminologia de Amílcar Cabral” (SILVA, 1996, p. 46). Inicialmente combatida pela ala mais conservadora do mundo negro, a “negritude” passou, posteriormente, a ser combatida pela sua ala mais radical. O nigeriano Wole Soyinka, sobre o movimento, ressaltava que "o tigre não precisa proclamar a sua tigritude" e o sociólogo Stanislas Adotevi (do Daomé) afirmava representar a “negritude” a "forma branca de se ser negro". Esta fala denuncia que, para estancar as ameaças de pulverização, o colonizado corria o risco de se refugiar na prática da reconstituição de uma identidade supostamente estável, fixa, fetichizando a diferença e ignorando o entre-lugar da subjetividade pós-colonial de que nos fala Homi Bhabha. O teórico afirma que a cultura de referência do lugar pós-colonial torna-se uma prática de sobrevivência e suplementaridade, reinscrevendo as "relações culturais entre esferas de antagonismo social" (2003, p. 244). O conceito de cultura distancia-se, pois, do paradigma estético ocidental e emerge de formas culturais não-canônicas produzidas no ato da sobrevivência social: “Reconstituir o discurso da diferença cultural exige não apenas uma mudança de conteúdos e símbolos culturais [...]. Isto demanda uma visão radical da temporalidade social na qual histórias emergentes possam ser escritas; demanda também a rearticulação do "signo" no qual se possam inscrever identidades culturais (2003, p. 240-1). Edward Said avalia a condição pós-colonial de regiões culturais como uma "tentativa extremamente vigorosa de abordar o mundo metropolitano em um esforço comum de re-inscrição, re-interpretação e expansão dos lugares de intensidade e do terreno disputado com a Europa" (1985, p. 389). Assim, a complexidade da construção identitária acentua-se quando articulada com a necessidade, conseqüência de contingências históricas, de se (re) definir a identidade em uma região pós-colonial dimensionada pela assimilação. Tal necessidade corre sérios riscos de cair no essencialismo da raça e na rigidez estática da reprodução de um sistema organizacional herdado da ex-metrópole, substituindo-se apenas o branco pelo negro. Portanto, a questão não seria a retomada do espaço que o branco ocupou na época colonial, mas a reinterpretação do lugar do sujeito pós-colonial inscrito na contra-textualidade colonial e emergente dela. Os porta-vozes da Negritude nos anos 30, Aimé Césaire, Léon Gontran Damas e Léopold Sédar Senghor, manifestavam o desejo de revitalizar no plano teórico e conceitual a herança cultural africana fundada na valorização da pureza racial ou étnica, motivo maior da crítica ferrenha de Stanislas Adotevi. Também a generalização da problemática negra pelos teóricos e artistas da Negritude incomodava Franz Fanon, assim como Amílcar Cabral, que argumentavam com as diferenças existentes entre os problemas enfrentados pelos negros norte-americanos e pelos negros africanos, pois que as culturas (como a história) se desenvolvem de modo desigual, seja dentro de uma mesma sociedade, raça ou continente. Cabral defendia haver várias áfricas e, portanto, várias culturas africanas. É no campo cindido entre a necessária solidariedade política e a improvável identidade cultural que se coloca, portanto, o centro da discussão sobre a Negritude. Propondo uma solução conciliadora, Kabengele Munanga afirma: Na história da humanidade, os negros são os últimos a serem escravizados e colonizados. E todos, no continente como na diáspora, são vítimas do racismo branco. Ao nível emocional, essa situação comum é um fator de unidade. (...) Portanto, cada grupo de negros deve adaptar-se e reajustar o conteúdo de sua NEGRITUDE, respeitando sua especificidade social, econômica, política e racial. A de um cubano, brasileiro, sul-africano e americano não devem ser reduzidas a um denominador comum, apesar da solidariedade. Esta não-redução não impede a troca de experiências entre as vítimas e a comparação entre os estudiosos. (1988, p. 57). De um modo geral, a “negritude”, movimento oriundo de concepções tão amplamente discutidas, foi se dissolvendo em facções que se opunham ou se friccionavam. No que toca às negritudes africana e brasileira, também se construíram correntes doutrinais, culturais e estéticas não inteiramente devedoras dos modelos fundacionais, fossem eles anglófonos ou francófonos. Pelo exposto, Pires Laranjeira, com mais de duas décadas de pesquisas dedicados à Negritude africana de língua portuguesa, destaca, no contexto de complexidade polêmica que envolve o conceito de “negritude”, a polissemia interpretativa que desencadeou desde sua nascença, assim como a leitura oblíqua, desprovida do acesso às fontes primárias, que é feita dos seus pressupostos. Sabemos hoje que o jornal L'Etudiant Noir, por exemplo, peça capital da instauração da négritude na França, não chegou a ser lido no original pelos autores de língua portuguesa que se debruçavam sobre a cultura negro-africana, embora fosse por eles referido. Posicionando-se “contra a corrente de pensamento dominante” (2000, p. VII) que defendia que a Negritude de língua portuguesa não teria existido _ opinião de Mário António Fernandes de Oliveira retomada por Salvato Trigo _ , Pires Laranjeira apresenta uma seleção de textos de apoio para a leitura de uma “poesia da negritude” manifestada, sobretudo, entre 1949 e 1959, buscando demonstrar que a Négritude francófona (dos anos 30) foi assimilada, dando origem a uma Negritude lusófona que testemunha a convivência do Sócio-Realismo africano com o racismo anti-racista (Sartre) pan-africano e globalizante, e a sua inevitável ultrapassagem nacionalista. Ressaltando a obliteração ou a má-avaliação de textos teóricos programáticos e informativos, Laranjeira redescobre, recupera e reabilita documentos que iluminam a importância da negritude _ definida como “construção de uma idéia da literatura negra” (2000, p. IX) _ na fase de emergência de novas literaturas de língua portuguesa. O tópico e os textos-testemunho correlatos que Pires Laranjeira apresenta (de Mário Pinto de Andrade, Francisco José Tenreiro, José Craveirinha, Agostinho Neto, Alda Espírito Santo, entre outros) permitem reexaminar o pensamento literário africano de língua portuguesa dos anos 50, década decisiva para a emergência das afronacionalidades. Para o estudioso, a Negritude lusófona deriva da Negritude francófona, movimento que ganhou expressão a partir da publicação do jornal L’Étudiant Noir, por então estudantes da Sorbonne. O termo foi usado pela primeira vez por Césaire, no seu poema “Cahier d’um retour au pays natal” (1939) e, mais tarde, em livro prefaciado por Breton (1947). A Negritude significa a expressão, sobretudo poética, do “ser negro”2, exaltando as tradições africanas ancestrais, valorizando o modo negro de estar no mundo (Senghor) e o posicionamento anti-colonial e anti-imperialista (Césaire). Dos textos de Damas (“Pigments”, 1937), Césaire (“Cahier d’un retour au pays natal” (1939) e Senghor (“Chants d’ombre”, 1945; “Hosties noires”, 1948; Anthologie de la nouvelle poésie noir de l’expression française et malgache, 1948) e dos fundamentos extraídos dos movimentos culturais e sociais negro-americanos, as colônias portuguesas da África puderam extrair, segundo Pires, elementos para embasar a Negritude dos anos 50, “uma das pontes culturais de passagem para os movimento de libertação” (2000, p. XIII) que atuaram nos anos 60. Francisco José Tenreiro incorporou ao seu Ilha de Nome Santo (1942) um universo africano de ressonâncias dramáticas e, com Mário de Andrade, lançou em 1953 o caderno Poesia negra de expressão portuguesa. O contexto histórico-político do aparecimento da Negritude nas colônias portuguesas não permitiu a organização de um movimento, visto que coincidiu com o recrudescimento da ditadura salazarista (a partir de 1949), culminando em 1965 com o fechamento da Sociedade Portuguesa de Escritores (que havia concedido o Grande Prémio de Novelística a Luuanda, de José Luandino Vieira), da Casa dos Estudantes do Império, da Edições Imbondeiro (Angola) e com a proibição de publicações como o boletim Mensagem (da C.E.I.), Msaho (Moçambique), Certeza (Cabo Verde), Mensagem e Cultura II (Angola). A partir dos anos 60 e até os anos 90, a “negritude” foi muitas vezes silenciada, negada ou esquecida, especialmente na sua feição senghoriana, em virtude de uma execração marxista que associava a independência do Senegal ao neocolonialismo francês. Para Laranjeira, “poucos terão tido a consciência plena, na década de 50, do seu alcance simbólico” (2000, p. XIV). Como bem o assinala Manuel Ferreira, “na prática, no terreno real dos textos, sobretudo poéticos, vamos encontrar autores vários cuja mensagem é a da Negritude (...): Marcelo Veiga, Francisco José Tenreiro, Alda Espírito Santo, Marcelino dos Santos, José Craveirinha, Noémia de Sousa, Virgílio de Lemos, Manuel Lima, Agostinho Neto, Alexandre Dáskalos. Poetas que investem o seu verbo na revelação e valorização dos autênticos segmentos da cultura africana encarada num processo dinâmico.” (1989, p. 78). Não há a configuração de um movimento, mas uma tendência revelada na poética de alguns autores africanos de língua portuguesa. Um texto de Mário Pinto de Andrade publicado em Mensagem da Casa dos Estudantes do Império, “A literatura negra e os seus problemas” (1951), usava o termo “negritude” para englobar as características da poesia negra das Américas, de Césaire e de Senghor, evidenciando que se pensava, à época, a nova poesia africana em diálogo com os modelos afro-americanos e afro-francófonos, que pregavam a revalorização do negro, o anti-esclavagismo, o regresso às origens africanas, o heroísmo negro, o protesto. No final dos anos 50, tanto Mário quanto Agostinho Neto faziam a apologia do “negro de todo o mundo”, pontuando para as colônias portuguesas uma |
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